16.5.06

O nó tático do professor Marcola

Paranóia em Sampa. Muito pior do que qualquer coisa que eu já presenciei no Rio de Janeiro. E não é à toa. Esse PCC já deu mostras de que não tem comparação entre ele e os bandos do Rio: CV, TC, ADA, IDI. Essas facções de traficantes dos morros cariocas são formadas grosso modo por jovens inconseqüentes que só querem fazer bonito com as meninas da favela, ganhar uma grana com o movimento e se sentir os maiorais com seus fuzis e motocas. De vez em quando causam pânico na cidade ao fechar túneis, o que certamente não é bom para os seus negócios. Afinal, morrem membros do grupo, armas são apreendidas e precisam ser recompradas da polícia, os clientes se afastam por um tempo. Criminosos sérios, com atitude empresarial, preferem a paz para garantir a lucratividade.

É o que se dizia do Rio de Janeiro em meados da década de 90. Todo mundo sabia que os morros eram dominados pelo tráfico, mas até que as ruas eram razoavelmente tranqüilas: os donos das favelas proibiam seus moradores de cometer crimes no asfalto para não afastar os bacanas que subiam para buscar pó. Mas esses chefes do crime foram substituídos por essa molecada que não pensa de maneira tão eficiente.

Em São Paulo a coisa é muito diferente. Honestamente, eu tinha até esquecido da existência do PCC. Fazia tempo que eles não tomavam nenhum atitude. Em 2003, o chuchu que governava o Estado se empertigou todo para anunciar que tinha decapitado o grupo. Pouco depois, um ônibus inteiro de membros desse grupo supostamente acéfalo foi metralhado pela polícia em uma estrada paulista. E o governo tucano começou a propagandear pelos quatro cantos que tinha reduzido a criminalidade no Estado, que maravilha, que genial.

Nesse meio-tempo, quando o PCC já estava quase esquecido para a maioria da população, eu incluso, chegou às minhas mãos uma matéria de jornal sobre as leituras dos presos nas cadeias paulistas. Alguns deles, curiosamente aqueles que eram suspeitos de pertencer à facção, tinham um perfil muito semelhante: Crime e Castigo, de Dostoievski. O Príncipe, de Maquiavel. A Arte da Guerra, de Sun Tzu. Entre outros clássicos semelhantes. O comentário entre meus amigos que tinham lido a matéria foi que os criminosos estavam tendo uma formação melhor que a polícia.

E é verdade. A estratégia do PCC foi brilhante. Deixou a polícia rodando como barata tonta. Senão, vejamos: na primeira madrugada, ataques a postos da PM e casas de policiais. A reação foi o bloqueio de avenidas como a 23 de maio (por quê?) e a Corifeu de Azevedo Marques (por quê?). Na segunda noite, ataques a agências bancárias, fóruns e outras instituições. A reação foi mais ou menos a mesma e a afirmação de que as coisas estavam sob controle (de quem?) e que São Paulo seria retomada (!!!) pelas forças da legalidade. Na terceira noite, dezenas de ônibus queimados.

Em entrevista coletiva na tarde de segunda-feira, o comandante da Polícia Militar, coronel Fechecler, demonstrando nervosismo e um português um pouco limitado, afirmou que a ocorrência de ataques a policiais estava diminuindo. Muito sagaz. Depois, afirmou que trinta e tantos criminosos haviam sido mortos e outros tantos estavam presos, e portanto tudo estava sob controle. Mais tarde, afirmou: “deveremos ter mais baixas. Vamos ter mais baixas. Estamos em guerra!”. Disse também que a paranóia da população era injustificada, mas que as empresas de transporte coletivo tinham razão em tirar seus ônibus de circulação, porque eles estão sendo atacados e queimados por criminosos.

Ou seja, ele não tem a menor idéia do que está acontecendo. Para quem ainda pensa que tem, vamos à brilhante frase com que a figura terminou seu discurso: “Por que a cidade não parou hoje?” e explicou que ela “não parou” graças ao brilhante trabalho da polícia.

Seu Fechecler, a cidade parou. E como.

Hoje, estive em Higienópolis, no Brás e na região da Santa Ifigênia, centro da cidade. Em todos esses lugares, vi aquelas Blazers da PM tentando avançar em meio aos engarrafamentos, sem grande sucesso. No Brás, vi os suspeitos que estavam sendo detidos: nenhum deles com a menor aparência de ameaça. Dois, por sinal, na casa dos 50 anos, gordinhos, meio carecas... Dá-lhe!

O PCC é muito mais preparado do que a polícia. Na segunda-feira, enquanto a PM saía à caça de “suspeitos” para prender e matar (foram trinta cadáveres hoje), os criminosos estavam calmamente em suas celas e casas fazendo telefonemas ameaçadores para o aeroporto de Congonhas, faculdades como a FAAP e assim por diante. Conseguiram o que queriam: deixaram seus inimigos batendo cabeça e pararam a cidade inteira. Aliás, pararam diversas cidades no Estado. Um prejuízo que certamente ultrapassa o bilhão de reais. O fechamento dos fóruns atacados impediu a polícia de conseguir mandados de busca e apreensão, prejudicando seu trabalho. Na linguagem do futebol, o professor (como os jogadores chamam os técnicos) Marcola, líder do PCC, deu um nó tático, aliás um verdadeiro banho, no governo paulista.

Enquanto isso, Lembo, Lula e outros lelés se reuniam tomando chá e chope. Devemos intervir no Estado ou não? Boa pergunta... passa mais um biscoitinho?

Mais sobre esse assunto em breve.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Começou muuuuito bem! O texto é ótimo.

02:32  

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