Um caderninho sagrado
Uma das melhores coisas dessa maçaroca de blogs chamada internet é a possibilidade de descobrir que não se está sozinho no mundo. Foi com muito atraso que conheci esse universo fantástico, mas em meus passeios já encontrei coisas formidáveis. Uma delas, que me deixou particularmente contente, foi neste blog aqui. Se não estiver errado o endereço que copiei, trata-se de um artigo em louvor ao Moleskine, um caderninho de capa dura, mais ou menos do tamanho de uma agenda telefônica. Ora, direis, um caderninho! O que tem de formidável?Perdoai-os, Pai, eles não sabem o que dizem. Em verdade, vos digo que esse objeto é extraordinário, ainda que discreto. Resolveu um dos maiores impasses de minha vida plena de encruzilhadas Várias vezes tentei estabelecer o hábito de andar com um bloco de notas, para anotar idéias, aforismos, observações e números de telefone. Nunca deu certo. Ou era grande demais, ou pouco prático, ou as páginas rasgavam, ou a capa se esfacelava em poucas semanas. Ainda mantenho a maioria, guardada em algum canto. Não há um sequer em que a escrita passe da décima página.
Esses sucessivos fracassos me incomodavam. Pessoas distraídas e errabundas (palavrinha adorável, não?) como eu certamente conhecem o traço mais característico das idéias: elas só dão o ar de sua graça quando estamos distantes de qualquer caneta, computador ou muro caiado. Em suma, quando não podemos registrá-las e corremos o risco de perdê-las para sempre. Da mesma maneira, sabemos que elas se vão logo que chegamos, finalmente, diante de um caderno ou
Andava desanimado, sem esperanças de laçar pensamentos soltos, quando encontrei "o mestre". Em minha memória vaga, tratava-se de um senhor de barbas brancas, compridas, um rosto enrugado, voz grave e cajado na mão. Mas a realidade insiste em colocá-lo na pele de um colega de faculdade, jogador de
Meu amigo, vendo minha surpresa, derramou uma enorme elegia daquele volume. Perguntou-me como eu ousava querer escrever sem possuir um daqueles. Qualquer artista digno do nome carregava sempre o seu. Hemingway, Picasso, Dostoievski. Quando ele disse Platão, objetei imediatamente. Nunca houve moleskines de pedra. Rindo, concordou. Era brincadeira. De qualquer forma, desde que houve moleskines no mundo, é item obrigatório de qualquer rascunhador. É um caderninho sagrado, sentenciou. Dito isso, o mestre se desfez no ar da estação.
Meu primeiro exemplar foi presente paterno. Preto, oitenta folhas grossas. Feito originalmente para desenho, mas perfeito para quem vira as folhas com luvas grossas, sob temperaturas negativas. Eu mesmo jamais o teria comprado. É caro, exatamente como dizem. Mas vale o investimento. Esse de oitenta páginas já está nas últimas. Antes de me ver obrigado a escrever na contracapa, já comprei o próximo. Resolvi testar um de folhas mais finas, 240, para ver como funciona. Não-pautados, naturalmente. É impossível escrever em linhas retas dentro de um trem.
Muitos textos deste blog tiveram lá seu começo, e sua conclusão no computador. Trabalhos para a faculdade, contos, poemas, lembretes, reflexões. A parte mais divertida fica por conta da descrição de gente sentada à frente. Reli recentemente algumas entradas mais antigas. Antigas é jeito de falar; as primeiras letras datam de janeiro. Há um sem-número de tolices, mas, por outro lado, também muita coisa interessante, aproveitável. Pouco a pouco, pretendo transcrevê-las.
E pensar que a humanidade passou dez anos sem esse fenômeno! A última fábrica, em Tours, França, fechou em 1986. A fabricação só foi retomada em 1996, na Itália. Desde então, o caderno tradicional, com sua capa dura (é de algodão, mas parece couro), com o elástico que o prende fechado, ganhou uma infinidade de versões. Típico do capitalismo contemporâneo: folha branca, colorida, pautada para músicos, com mapa da cidade, agenda de telefone, agenda do ano, motivos florais, de super-heróis infantis... Estou exagerando, mas não duvido nada de que venha a acontecer.
Fiquei contente ao descobrir que minha paixão não é exclusiva. Vivam os blogs! Andei pesquisando, e descobri que o Neil Gaiman, de











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